(C) The Conversation This story was originally published by The Conversation and is unaltered. . . . . . . . . . . Fotografia selvagem: beleza, reflexão e, às vezes, bons resultados na defesa da natureza [1] ['Luiz Gustavo De Almeida'] Date: 2024-06-05 07:37:21+00:00 Em 2014, a então primeira-ministra jamaicana, Portia Simpson-Miller, iniciou negociações com a China Harbour Engineering Company para construir um porto na Great Goat Island, uma pequena ilha localizada na costa da Jamaica. A construção desse porto traria graves consequências ambientais, incluindo a ameaça de extinção da Iguana Jamaicana, uma espécie já vulnerável. Essa iguana, apesar de sua aparência assustadora para muitas pessoas, é extremamente sensível. A espécie já esteve à beira da extinção por conta de diversas ameaças, como a caça e a predação por cães selvagens, gatos e porcos. A destruição de seu habitat para a produção de carvão piorou ainda mais essa situação. A construção do porto na Great Goat Island seria o golpe final, acabando com a última esperança de salvar a Iguana Jamaicana. Diversos alertas, relatórios e cartas a respeito do impacto que a obra causaria foram entregues às autoridades e os envolvidos na obra. Porém, foram as fotos do jovem e premiado fotógrafo escocês Robin Moore, colaborador de algumas das revistas científicas mais prestigiadas do mundo e diretor da Global Wildlife Conservation, que ajudaram a mudar o futuro da Iguana Jamaicana. Experiente em publicações dedicadas à conservação da vida selvagem, Moore utilizou imagens e vídeos que captou na Jamaica para mobilizar a opinião pública contra a construção do porto. Isso incluiu campanhas de cartões-postais enviados para o mundo inteiro. Na lista de remetentes estava a própria primeira-ministra Simpson-Miller, que havia iniciado o projeto de construção do malfadado porto. E ela se sensibilizou. Ao obter a simpatia da líder política do país para sua causa, Moore conseguiu que sua história ganhasse cobertura em grandes veículos internacionais, como o The Guardian e o The New York Times. Após dois anos e meio de campanha intensa, auxiliada por grupos locais e pela Jamaican Environment Trust, o governo do país decidiu oficialmente não construir o porto na área protegida, garantindo a sobrevivência da iguana em seu habitat. A história de sucesso da iguana jamaicana demonstra o poder que a fotografia de vida selvagem ainda tem para sensibilizar a sociedade - e eventualmente convencer o poder público - em prol da proteção da natureza. Outro exemplo significativo e recente disso é o trabalho de Steve Winter, que documentou a exploração de tigres cativos nos Estados Unidos, em 2013. Suas fotografias, publicadas na National Geographic, expuseram as condições deploráveis em que alguns desses animais eram mantidos, provocando uma reação pública e política imediata. A indignação gerada pelas imagens levou à aprovação do Big Cat Public Safety Act, uma lei que controla o comércio de grandes felinos em cativeiro nos EUA. Esse marco legal demonstra como a fotografia pode influenciar mudanças sociais e legislativas significativas. Da mesma forma, Suzi Eszterhas, uma renomada fotógrafa de vida selvagem, também tem contribuído significativamente para a conservação através de suas imagens. Especializada em filhotes de animais, Suzi fotografou preguiças no Santuário de Preguiças na Costa Rica, fortalecendo sua dedicação à conservação. Junto com a pesquisadora Becky Cliffe, ela ajudou a fundar a Sloth Conservation Foundation. As fotografias de Suzi aumentaram a conscientização sobre as ameaças enfrentadas pelas preguiças e arrecadaram fundos substanciais para a fundação. Imagens da vida selvagem nos fazem refletir sobre como, quando, onde e por que os animais agem como agem. O genoma humano é 98% similar ao de bonobos e chimpanzés, mas nossa cultura e a capacidade de pensamento nos diferenciam muito de nossos parentes símios. Como o cientista e filósofo Judea Pearl ilustra em seu livro “The Book of Why”, a maioria dos animais, assim como os computadores de IA atuais, aprendem por associação, o que representa o primeiro degrau do aprendizado humnano. Os utilizadores de ferramentas, como os primeiros humanos, atingem o segundo degrau ao agir por planejamento, e não apenas por imitação. Além disso, aprendemos os efeitos das intervenções através de experiências, da mesma forma que os bebês adquirem grande parte de seu conhecimento causal. No terceiro e último degrau temos os aprendizes contrafactuais, que são capazes de imaginar mundos alternativos e inferir razões para os fenômenos observados. Essa capacidade de refletir sobre diferentes possibilidades e entender contextos complexos também se aplica à nossa percepção visual. Assim como o árbitro de vídeo no futebol (VAR) permite que vejamos detalhes que passaram despercebidos durante a velocidade do jogo, as fotografias de vida selvagem nos fazem refletir calmamente sobre críticas questões ambientais. Ao olharmos uma imagem repetidamente, percebemos novos detalhes e significados que não eram evidentes à primeira vista. Esse processo de observação atenta pode nos ajudar a entender melhor os contextos e as implicações das questões que estamos observando, assim como o VAR ajuda a esclarecer lances controversos. As questões ambientais e de mudança climática são, fundamentalmente, questões de ciência. No entanto, para causar um impacto significativo na opinião pública e nas decisões políticas, é essencial aliar a ciência com a comunicação científica. Dados e projeções numéricas, por si só, muitas vezes não conseguem mobilizar ações concretas. Foi o que vimos durante a pandemia e nas enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul. A visualização desses dados através de imagens pode criar uma conexão emocional e uma compreensão mais profunda do problema, levando a uma ação mais eficaz. Nesse contexto, a 59ª edição da exposição do prêmio Wildlife Photographer of the Year (Fotógrafo de Vida Selvagem do Ano), que está no Brasil, traz uma oportunidade única para promover essa conexão entre a conservação da natureza e a arte. A exposição começou no dia 28 de maio e vai até 25 de agosto, na Galeria Marta Traba, no Memorial da América Latina, em São Paulo, e tem entrada gratuita. As fotos que ilustram este artigo estão entre as obras da exposição. Em uma sociedade onde os vídeos estão cada vez mais curtos e a atenção é cada vez mais fragmentada, exposições fotográficas nos convidam a refletir com calma e um pouco mais de profundidade sobre o mundo. Com mais tempo para pensar e, eventualmente, tomar decisões que possam contribuir para um futuro melhor. 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